novembro 09, 2008

Sobre viajar

Habitamos em várias cidades. São nossas cidades, não só aquela em que nascemos e/ou em que vivemos, mas aquelas que visitamos, ou desejamos visitar, aquelas com que sonhamos ou imaginamos...
Mas o que procuramos quando visitamos uma cidade?
Viajamos, dentre outras razões, para mudar de ares, buscar novas paisagens, novos cenários, experimentar a sensação de estrangeiridade... No entanto, acontece de visitarmos ruas, cafés, catedrais, museus, parques, trajetos e voltarmos um tanto desapontados, como o elefante da poesia de Carlos Drumnond, “... faminto de seres e situações patéticas, de encontros ao luar no mais profundo oceano, que saiu à rua à procura de amigos num mundo enfastiado que já não crê nos bichos e duvida das coisas”
“.... já é tarde da noite, volta meu elefante, mas volta fatigado....ele não encontrou o que carecia, o de que carecemos eu e meu elefante, em que amo disfarçar-me “.

De que carecemos nessas peregrinações pelas cidades do mundo?
Procuramos reencontrar ou recuperar momentos, situações, ou como diria o poeta: “sítios, segredos, episódios não contados em livro, de que apenas o vento, as folhas, a formiga reconhecem o talhe, mas que os homens ignoram, pois só ousam mostrar-se sob a luz das cortinas à pálpebra fechada”.
Estamos à procura do mundo onírico de que fala Ítalo Calvino, das cidades invisíveis que habitam nossa mente, onde buscamos encontrar o que foi sonhado.
Marco Pólo - nas Cidades Invisíveis - diz que quanto mais se perdia em bairros desconhecidos de cidades distantes, melhor compreendia as outras cidades que havia atravessado para chegar até lá , e reconstruía as etapas de sua viagem, e aprendia a conhecer o porto de onde tinha zarpado , e os lugares familiares de sua juventude, e os arredores de casa, e uma pracinha de Veneza em que corria quando era criança.
Os outros lugares seriam espelhos em negativo, onde quem viaja reconhece o pouco que é seu descobrindo o muito que não teve e o que não terá.
Isto é o que a viagem em grupo, acompanhada por um guia, nos impede de encontrar.O que procuramos não está lá, não daquela forma . As cidades de nossas mentes não obedecem às fronteiras formais, nem se referem ao que nos mostram.
Temos que nos deixar guiar pela emoção, o sonho, a memória, o imprevisto, o surpreendente e a idéia romântica de que estar nesses lugares fará de nós outra pessoa, a expectativa de que mudanças se darão magicamente ...
Acabamos viajando, principalmente, para dentro de nós mesmos.

Um comentário:

Anônimo disse...

Sou do tipo que não posso ver um meio de transporte que quero pegar para viajar: ônibus, táxi, trem, barco, avião etc. Mais ou menos pegando uma 'bochecha' com o Marco Polo, lembro que quando me distanciei muito da minha terra, indo morar na Alemanha, foi como passei melhor a ver o que se passava por aqui. O distanciamento me obrigava a me (re)aproximar, até porque, a toda hora, eu era intimado a dar satisfações sobre uma possível moratória brasileira (em plena 'era' Sarney), sobre a destruição das florestas, sobre a exploração de menores, sobre o analfabetismo crônico e endêmico, sobre a falta de educação formal e informal (!) de nosso povo etc. etc. Em plena 'era' lúlica (bergh! que tristeza! que horror!), realmente ficaria até deprimido se tivesse de morar forar e tentar dar explicações que eu nunca teria como inventar. Mas não pense que morar aqui, de volta, é fácil! Mas, em qualquer lugar, será difícil, pois não há lugar totalmente bom nem totalmente ruim. E estrangeiro se é em qualquer lugar...Beijos do TL