julho 31, 2012

Deixe eu falar de mim!


"Graças à fala, humanos podem facilmente trocar ideias e conhecimentos, filosofar em voz alta e fazer planos sobre como mudar o mundo.
Na prática, contudo, a fala é usada quase a metade do tempo para tratar do próprio umbigo e comunicar como nós mesmos nos sentimos, do que gostamos ou o que pensamos. De 30% a 40% da fala cotidiana trata de experiências próprias ou relacionamentos e incríveis (mas não surpreendentes) 80% dos "posts" em mídias sociais servem para irradiar ao universo a vida pessoal de cada um.
É claro que há várias vantagens em falar de si mesmo. Fazendo isso, compartilhamos experiências e aprendemos uns com os outros, um benefício talvez já grande o suficiente para garantir que, evolutivamente, o hábito de falar de si mesmo fosse mantido e passado adiante.
Mas algo especial faz com que humanos falem tanto de si mesmos. Um estudo da Universidade Harvard mostrou que o hábito vem de uma preferência real com origens no sistema de recompensa do cérebro, aquele conjunto de estruturas responsáveis por nos premiar com uma sensação física de prazer quando fazemos algo que o resto do cérebro considera positivo ou interessante de alguma forma.
Segundo o estudo, mesmo tendo a opção de embolsar mais dinheiro para responder a perguntas sobre gostos e hábitos de outras pessoas ou sobre simples fatos, voluntários escolhem ganhar menos para falar de si mesmos -e de dentro de um aparelho de ressonância, onde só os pesquisadores veem suas respostas.
A escolha está relacionada à maior ativação das estruturas do sistema de recompensa, o que gera prazer e aumenta as chances de que, da próxima vez que a alternativa for oferecida, a opção seja mais uma vez por... falar de si mesmo.
Funciona mesmo quando segredo completo é garantido. Mas, seres sociais que somos, a ativação do sistema de recompensa é especialmente alta quando os voluntários sabem que suas respostas serão ouvidas pelo acompanhante que eles levaram para o estudo. Falar de si é bom, mas falar de si para os outros é melhor ainda.
Não é à toa, portanto, que a liberdade de expressão pessoal e de opinião é altamente valorizada. Não se trata apenas de um construto social ou cultural: o prazer de expressar os próprios pensamentos e estado de espírito é real, mensurável e vem lá dos cafundós do cérebro".
SUZANA HERCULANO-HOUZEL é neurocientista

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