junho 17, 2011

A Paris de Wood Allen


Na abertura ele deixa de lado seus créditos minimalistas – letras brancas sobre tela preta – e passeia por Paris numa sequência " cartões-postais", ao som do clarinetista Sidney Bechet, de quem é fã. Uma abertura e tanto!
Um candidato a escritor, roteirista de filmes ( "adoráveis, mas esquecíveis") em Hollywood, viaja com sua noiva e os pais dela. Ele (como eu
)  alimenta um sonho que revela todo o fascínio pela Paris dos anos vinte: pertencer a ”turma”:  Fiztgerald, Hemingway, Picasso e tantos outros loucos  que frequentavam a lendária casa de Gertrude Stein 27, rue de Fleurus, onde sua companheira  Alice Toklas era a cozinheira (no filme há uma cena em que  ela abre a porta), enquanto Gertrude  palpitava sobre  literatura e  artes plásticas, decidindo o destino de quase todos que por lá passavam...
Apaixonados pelos anos 20, como eu,  se interessam em conhecer a Brasserie (Lipp) onde James Joyce comia salsichas, sentam à mesa do  Hemingway, (na Closerie des Lilas) -  suas poucas  falas no filme dizem tudo de sua personalidade !-  ,  frequentam  a Shakespeare and Companyque publicou James Joyce , quando ninguém o conhecia nem apostava nele, perambula pela  Paris  do WA, quando os  analgésicos e antibióticos eram ficção científica ...mas  que, sem dúvida, era uma festa !!!
Voltando ao filme, uma coisa meio maluca que ( à semelhança do que fez em Rosa Púrpura do Cairo) leva o personagem ( seu alter ego, um neurótico clássico e atrapalhado ) a se perder em Paris e acabar sendo levado à uma festa oferecida ao Jean Cocteau, ouvindo Cole Porter ao piano, numa roda de conversa com Scott e Zelda , Hemingway,  conhecer T.S. Eliot, Matisse, Buñuel e apaixonar-se pela amante de Picasso, ex de Modigliani e Braque. 
WA não só comprova seu talento inigualável para racionalizações absurdas (“Eu sou um sujeito confiante e ciumento. É uma dissonância cognitiva!”) como ainda aproveita para brincar com seus famosos personagens, levando seu protagonista a sugerir a ideia de O Anjo Exterminador a Buñuel (que insiste em pedir uma explicação para o fato de os convidados não conseguirem deixar a sala de jantar) e a comentar a insistência da Djuna Barnes em conduzi-lo durante uma dança
Sob a fachada da comédia – serve-se do túnel do tempo como pretexto para refletir sobre as ilusões que temos sobre a existência. Brinca com Salvador Dali, Man Ray, Luis Buñuel, o que rende uma ótima piada com os surrealistas.
Um sonho que não é um mero retorno ao passado, mas uma maneira de reordenar o presente e a  percepção de que o tempo não existe, a não ser como outro sonho. Uma afirmação da identidade entre fantasia e realidade, que talvez seja o que de melhor o cinema pode criar. 
Na estória 'paralela', a noiva, seus pais e amigos  revelam-se os típicos americanos: fúteis e pedantes, com um agravante imperdoável de serem republicanos.
Imagine o quanto virava a cabeça para olhar os afiches, em todos os cinemas de Paris, nos dias de maio em que lá estive.
E ainda há quem não me considere uma boa companheira de viagem... 
 Sobre viver na Paris dos anos 20, Wood Allen é categórico. “Teria dificuldades. Os dentistas ainda não conheciam bons anestésicos!”  O que ele diz sobre os seus 'personagens' :

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