agosto 05, 2012

O doce anjo do sexo


"Soube da morte de Marilyn Monroe por uma amiga. Ali pelo meio de um domingo convenientemente nublado, o telefonema ominoso: "Acabei de ouvir no rádio que a Marilyn morreu". Acidente de carro?, perguntei. "Não. Parece que ela se suicidou." Sem experiência com a morte de parentes ou amigos próximos, a morte de Marilyn, que hoje completa 50 anos, me deixou inusitadamente arrasado; até então nunca havia lidado com o desaparecimento de alguém com presença tão marcante em minha vida ainda tão pouco vivida.
Sua mais remota aparição diante dos meus olhos e ao alcance de minha palmar cupidez deu-se nas páginas da revista O Cruzeiro, no início dos anos 1950: ela metida num vestido feito de saco de aniagem para marquetar a ideia de que com qualquer invólucro a mais promissora estrelinha da Fox era um prodígio de elegância carnal. Foi minha primeira epifania voyeurística. A sexualidade da minha geração tem um débito incalculável com Marilyn Monroe.
Algum tempo se passou até que eu passasse a desfrutá-la na tela, como Rose Loomis, Lorelei Lee, Kay Weston, a levar marmanjos à loucura, induzi-los ao uxoricídio, ao adultério - ou simplesmente domesticá-los, como a desajeitada crooner Chérie fez com o caubói capiau de Nunca Fui Santa. Se a garota (ou o pecado) que na verdade morava em cima, não ao lado, extravasou o sex-appeal de Marilyn, explorando-lhe todas as curvas do corpo, em especial seus dotes calipígios, e plasmando sua pose mais mítica, com a saia esvoaçante sobre a grade do metrô, a angelical garota de Nunca Fui Santa adocicou-lhe a sensualidade, metamorfoseou a Vênus platinada numa criatura prosaica, frágil e vulnerável.
Marilyn ainda encarnaria três outras Afrodites de ribalta, Elsie (a corista de O Príncipe Encantado, cujas filmagens inspiraram o recente Sete Dias com Marilyn), Sugar Cane (a esfuziante flapper de Quanto Mais Quente Melhor) e Amanda Dell (a romântica dançarina de Adorável Pecadora), mas a candura projetada por Chérie e o desamparo estampado em cada gesto da Roslyn Taber de Os Desajustados marcaram sua imagem até o fim. Foi com essa persona - de mulher meiga, carente, desestabilizada emocionalmente e também deixada na orfandade pela indústria que ajudara a resistir ao impacto da televisão - que a mídia a pranteou em agosto de 1962. Com a pieguice de praxe.

SÉRGIO AUGUSTO

Nenhum comentário: