Agradecimento
Devo muito
aos que não amo.O alívio de aceitar
que sejam mais próximos de outrem.
A alegria de não ser eu
o lobo de suas ovelhas.
A paz que tenho com eles
e a liberdade com eles,
isso o amor não pode dar
nem consegue tirar.
Não espero por eles
andando da janela à porta.
Paciente
quase como um relógio de sol,
entendo o que o amor não entende,
perdoo,
o que o amor nunca perdoria.
Do encontro à carta
não se passa uma eternidade,
mas apenas alguns dias ou semanas.
As viagens com eles são sempre um sucesso,
os concertos assistidos,
as catedrais visitadas,
as paisagens claras.
E quando nos separam
sete colinas e rios
são solinas e rios
bem conhecidos dos mapas.
É mérito deles
eu viver em três dimensões,
num espaço sem lírica e sem retórica,
com um horizonte real porque móvel.
Eles próprios não veem
quanto carregam nas mãos vazias.
"Não lhes devo nada" -
diria o amor
sobre essa questão aberta.
* * *
DIVÓRCIO
Para os filhos, pela primeira vez o fim do mundo.
Para o gato, novo dono.
Para o cachorro, nova dona.
Para os móveis, escadas, rangidos, caminhão, transporte.
Para a parede, quadrados brancos depois de retirados os quadros.
Para os vizinhos do térreo, um tema, um intervalo no enfado.
Para o carro, seria melhor se fossem dois.
Para os romances, poesia -de acordo, leve o que quiser.
Pior para a enciclopédia e o videocassete
e para aquele manual de escrita
onde se encontram talvez as regras de uso dos nomes compostos -
se ainda os liga a conjunção "e"
ou se os separa um ponto final.
Nota : Para POEMAS ( arquivo em PDF da Companhia das Letras) siga por aqui
Link no título para saber mais .
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