novembro 14, 2011

Bumerangue de gerações

"Silvio Berlusconi recentemente descartou a crise financeira da Itália como muito barulho por nada. "Os restaurantes estão cheios", ele disse, "é difícil reservar lugar em um avião" e os resorts de férias estão "completamente lotados".
O primeiro-ministro italiano, que acabou por renunciar na semana passada por causa da crise da dívida, conquistou uma reputação merecida como um dos líderes menos sérios do mundo. Mas eu estive na Itália nas últimas semanas e posso confirmar que a tese dele tem algo de sério. Talvez ninguém queira os títulos italianos, mas certamente querem suas praias e bela figura. É impossível não reconhecer um país rico quando você vê um.
A mais antiga e segura apólice de seguro da Itália é, sem dúvida, a família. Os empregos podem estar raros e os tempos, difíceis, mas a Mamma estará sempre lá. Os filhos italianos saem de casa em média aos 28 anos. A Suprema Corte decidiu alguns anos atrás que um pai não poderia cortar a ajuda financeira a sua filha de 26 anos, formada na faculdade, porque os jovens estão tendo dificuldade para encontrar empregos.
Os americanos costumavam rir dessa tendência italiana a ficar na casa dos pais até a idade adulta, que se estende até certo ponto a todos os países da Europa mediterrânea. Eu me lembro, quando vivia em Roma, que achei hilário quando um engenheiro telefônico de meia-idade usou a linha que acabara de instalar no meu apartamento (depois de 15 meses de espera) para ligar para a Mamma e pedir desculpas efusivas por estar atrasado para o almoço.
Ninguém mais está rindo. A tendência bumerangue nos Estados Unidos -jovens que saem de casa mas voltam -está crescendo, enquanto os empregos se mostram cada vez mais difíceis de encontrar.
A parcela de homens de 25 a 34 anos que moram com seus pais saltou para 18,6%, o nível mais alto pelo menos desde 1960, segundo o Departamento do Censo dos EUA. A América está seguindo a rota italiana.
O motivo não é difícil de encontrar: o desemprego entre colegiais formados nesse grupo etário disparou para 14,4%, contra 6,1% quatro anos atrás. Pelo menos mamãe vai pôr alguma comida na mesa e não é preciso pagar o aluguel.
Em uma faixa etária ligeiramente mais jovem, a de 20 a 24 anos, o desemprego alcançou 22,4%, segundo o jornal "Wall Street Journal".
Alguns desses jovens hoje dormem nas ruas, como parte do movimento "Ocupe Wall Street". Eles estão com raiva e receberam muita atenção. Mas talvez a verdadeira revolução que se prepara está com a geração bumerangue, os jovens americanos que ocupam a casa dos pais em uma idade em que a raiva cega adolescente já se dissipou e os pais se tornaram novamente visíveis.
Os Estados Unidos têm todo tipo de problema, mas um dos maiores é a síndrome de fratura. Com isso quero dizer a ruptura dos três Cs: comunidade, conversa e calor humano.
Um emblema suficientemente adequado disso é: quatro pessoas em torno de uma mesa em um café, cada uma com seu dispositivo eletrônico. Um sistema político polarizado, incapaz de encontrar terreno comum, é um reflexo de uma sociedade com elos partidos -crianças viciadas em videogames, idosos morrendo sozinhos, veteranos de guerras distantes dos familiares que não recebem o que lhes é devido.
Sejam quais forem os defeitos da Itália, é um país de solidariedades ocultas. A trama da tapeçaria italiana é densa; a tapeçaria americana está puída.
Talvez agora tenhamos uma geração de americanos que, obrigados a ficar em casa até os 30 anos, também são por isso obrigados a aprender um pouco de troca, respeito, comunicação e partilha -e com eles um país um pouco menos "eu" e um pouco mais "nós".
Não acho que os empregos vão voltar correndo e não acho que a mudança de poder no mundo -para longe dos EUA e em direção às potências emergentes- vai desacelerar. A família pode ser um amortecedor da dificuldade e frustração. Certamente o e na Itália, país que se adaptou muito tempo atrás à perda de seu império. No lugar de suas legiões ela encontrou amizade. A América poderia se sair muito pior.
Uma velha piada pergunta por que é óbvio que Jesus Cristo era italiano. Resposta: porque ele morou com os pais até os 30 anos, sempre saía com os mesmos 12 amigos, acreditava que sua mãe era virgem e sua mãe pensava que ele era Deus. Agora que os americanos vivem em casa até os 30, espere que os milagres vão começar".
Roger Cohen

Um comentário:

Anônimo disse...

Gostei do artigo, mas não vejo saía nem conclusão otimista.