"Muitas vezes, quem melhor capta a essência de uma época são aqueles que nela não se ajustam: os náufragos da história, condenados a lutar de forma apaixonada contra o tempo em que nasceram – e, por isso mesmo, capazes de vivê-lo e de interpretá-lo com intensidade única. Nesse sentido, o judeu alemão Walter Benjamin (1892-1940) encarnou como poucos a alma da modernidade – porque nela se sentia desconfortável, desorientado e cheio de angústia. Homem de sensibilidade passadista e aspirações utópicas, foi um espírito do século 19 transportado para o século 20: viu a civilização industrial com olhos de estrangeiro e por isso foi capaz de compreendê-la profeticamente.
Crítico literário, pensador político e filósofo da história, Benjamin foi, antes de tudo, um “homem de letras” (no sentido mais clássico e mais amplo do termo) numa época em que a ditadura dos especialistas já começava a estrangular o mundo ocidental. Profundamente judeu e profundamente alemão, só se sentia realmente em casa passeando pelas ruas de Paris – cidade que descrevia deliciosamente como “a capital do século 19”. Era dono de grande erudição, mas jamais se tornou um erudito profissional: desprezado pelas academias durante a vida, só foi por elas endeusado após a morte. Deixou- se seduzir pelo marxismo, mas jamais se encaixou no padrão do intelectual materialista, guardando até o fim da vida um viés místico herdado da tradição judaica. Todos esses ingredientes fizeram dele um desajustado universal. Não foi um favorito da fortuna, e sabia disso – até o último momento, sua existência foi marcada por uma mistura de má sorte, brilhantismo e trágica autoconsciência. Foi um daqueles que, no dizer do latino Cícero, “só venceram na morte”.
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