novembro 11, 2010

A curiosidade do leitor

"FIZ PAPELÃO, aliás, sempre faço quando me convidam para falar em público. Rita Lobo me convidou para uma entrevista na Casa do Saber. "Grandes Comilões". Lá fui eu.
Ela está cada vez mais inteligente e linda, ótima como entrevistadora, mas não havia jeito de evitar o desastre. Me dá amnésia, branco, o desconfiômetro pifa e o politicamente correto vai pro brejo. Esqueço nomes dos livros e de seus autores. Digo o que poderia dizer se fosse muito burra, e não sou. E a afasia, só o Oliver Sacks para curar.
E, além disso, as pessoas têm expectativas quando gostam de uma cronista ou de uma dona de bufê. É preciso corresponder ao imaginário das pessoas. Não pode ser uma velha ranzinza se o que escreve é sempre risonho.
Bom, agora eu sei o que elas queriam saber de mim (ao sair da sala você sabe, imediatamente você sabe). E vou responder a cada quesito, aos poucos. Imagino que o mesmo queiram saber os leitores. Vamos lá. Respondendo...
Quase não vou a restaurantes. Provo comida diariamente no bufê, provei comida dos chefs de São Paulo e do Brasil e do mundo a partir do dia em que comecei a escrever para a Folha. Sei direitinho o que está bom e o que não está. Então, antipaticamente, só quero saber de restaurante muito bom. Ou melhor, de restaurantes que fazem a comida que gosto. E a estes elogio sempre, aqui na coluna mesmo. Mas, como saio pouco, devo estar sendo injusta com centenas de outros nos quais não pisei.
E então, do que é que gosto? Branco total. Só me lembrei de pão com manteiga. Realmente deve ser pão com manteiga se é só disto que me lembro. Ah, jabuticaba também. Mas como uma especialista em comida só gosta de pão com manteiga e jabuticaba? Xii...
Pensando bem, gosto de tudo o que é bem feito, saboroso. Menos de fígado.
A comida dos funcionários do bufê, frango ensopado, farofa (huumm), um músculo fabuloso que fazem de vez em quando, sardinha frita e sequinha, pastel, feijoada, esqueci de falar feijoada, acho que é o que mais gosto. Com farinha e sem arroz.
Lembro com saudade do frango da minha mãe, das empadinhas. Não adoro camarão, nem desgosto totalmente. Prefiro mil vezes feijão a arroz. Um belo macarrão tem a sua hora.
Não gosto de legumes e de verduras assim puros, como Deus botou no mundo.Tem que ter azeite bom, sal e pão. Adoro berinjela, abóbora, alho, detesto abobrinha, se está bem frita ainda vai, e um foie gras adoro também.
Quando chego em casa com fome, peço um delivery. A tortinha ou os bolinhos de arroz do Ritz, comida de mãe, só que da mãe da minha cunhada Maria Helena.
Já fui moça, já viajei para comer, já corri mercados antes de desfazer a mala. A idade traz não maturidade, mas menos surpresas.
Lembro de uma amiga que desceu do avião depois de uma viagem de dois meses e imediatamente tirou os óculos de grau e enfiou na bolsa.
"O que foi que te deu, Ângela?" "Não quero ver mais naaaaaada, chega de ver", respondeu aliviada.
A velhice não é bem não querer ver mais nada. Menos, menos".


NINA HORTA

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