outubro 14, 2010

A Trégua

"Um grande amor pode ser uma trégua na vida"

A Trégua é o livro do autor uruguaio Mário Benedetti escrito em forma de diário e com fina ironia. É a história de um ‘homem maduro', prestes a completar 50 anos, viúvo há mais de vinte e que mora com os três filhos. Não se relaciona muito bem com nenhum deles, tem poucos amigos e mantém uma rotina monótona e cinzenta. No diário, conta os dias que faltam para a aposentadoria, sem ter idéia do que fará assim que se livrar do trabalho maçante. Ao conhecer, na empresa em que trabalha, Laura Avellaneda, uma jovem discreta e tímida encontra uma luminosa trégua para uma vida até então triste e opaca. Mais do que uma história de amor, ‘A trégua’ é um questionamento sobre a felicidade e um retrato às vezes bem-humorado, às vezes ferino, dos relacionamentos.

Segunda-feira, 3 de fevereiro
"Ela me dava a mão e então nada mais faltava. Bastava para que eu me sentisse acolhido.
Mais que beijá-la, mais que dormirmos juntos, mais que qualquer outra coisa, ela me dava a mão e isso era amor."

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“Segunda, 11 de fevereiro
Só me faltam seis meses e 28 dias para estar em condições de me aposentar. Deve fazer pelo menos cinco anos que mantenho este cômputo diário de meu saldo de trabalho. Na verdade, preciso tanto assim de ócio? Digo a mim mesmo que não, que não é de ócio que preciso, mas do direito a trabalhar no que eu quiser. Por exemplo? Jardinagem, quem sabe. É bom como descanso ativo para os domingos, para contrabalançar a vida sedentária e também como defesa secreta contra minha futura e garantida artrite. Ms temo não conseguir aguentar isso diariamente. Violão, outra hipótese. Acho que me agradaria. Mas começar a estudar solfejo aos 49 anos deve ser meio desolador. Escrever? Talvez não o fizesse mal; pelo menos, as pessoas costumam gostar de minhas cartas. E depois? Imagino uma notinha bibliográfica sobre as “notáveis qualidades deste autor estreante que beira os 50”, e a mera possibilidade me causa repugnância. Que eu me sinta, até hoje, ingênuo e imaturo ( isto é, com os defeitos da juventude e quase nenhuma de suas virtudes) não significa que eu tenha o direito de exibir esta ingenuidade e imaturidade. Tive uma prima solteirona que, quando preparava uma sobremesa, insistia em mostra-la a todos, com um sorriso melancólico e pueril que lhe havia ficado preso nos lábios desde a época em que se exibia para o namorado motociclista, o qual depois se matou numa de nossas Curvas da Morte. Ela se vestia de maneira correta, inteiramente de acordo com seus 53 anos; nisso, e no resto, era discreta, equilibrada, mas aquele sorriso reclamava um acompanhamento de lábios frescos, de pele roçagante, de pernas torneadas, de 20 anos. Era um gesto patético, só isso, que não chegava nunca a parecer ridículo, porque naquele rosto havia também bondade. Quantas palavras, só para dizer que não quero parecer patético.”

Acesso ao texto, linkando no título

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