novembro 01, 2009

Ouvido amigo

Além dos profissionais que são pagos para ouvir , existem cabelereiros, massagistas barmen, dentre outros, que ajudam a preencher a necessidade de seus clientes nesta área . Quase todo mundo tem necessidade de se abrir e alguns encontram nestes profissionais a empatia que os levam aos desabafos. Conheço quem, numa simples consulta sobre queda de cabelo, conte a sua vida. Outra que, na compra de uma roupa, discorre sobre as transformações pelas quais passou o seu corpo depois da menopausa....Este comportamento não é tagarelice própria de mulheres. Entre os homens também acontece.
Pode não equivaler a uma terapia, mas encontrar alguém, ainda que seja um desconhecido, que empresta um ouvido atento, pode servir para aliviar certas dores que precisam ser compartilhadas.
Para mim este 'divã' improvisado não funciona. Se é para falar por falar, melhor escrever. De preferência para alguém que vai ouvir com afeto.
No entanto, se me fosse dado escutar certas histórias, tentaria extrair o que houvesse de mais profundo na prospecção dessas almas. Na verdade, não sei se tenho cara de confessionário, mas alguns 'loucos' encontrados ao acaso, me relatam de suas vidas aquelas zonas tenebrosas, inconfessáveis mesmo diante de espelhos embaçados. ( Imagem embaçada é como enxergo quando tiro os óculos, o que sempre fiz diante da terapeuta ao ponto de ela hoje não ter rosto na minha memória).
Imagino relatos curiosos, histórias de amor, que chegam aos ouvidos de um barman quando a noite e a bebida liberam as almas solitárias (o que não o livra inclusive de uma 'cantada'!).
Na posição inversa, de cliente solitária, algumas vezes já ouvi. Na travessia Santos/Gênova troquei algumas palavras com um garçom que me disse ser de Honduras. Acho que a 'chave' para o que se seguiu foi eu saber qual era a capital de seu país. Segundo ele, ninguém sabia. Em capítulos, (a viagem durou mais de 15 dias), ouvi suas estórias, vi fotos, fiquei sabendo o que é viver para cá e para lá e, em meio a tanta gente, ser 'transparente'.
Em Paris, os garçons não se dão a estas liberdades. Apenas uma vez, num café chamado “Le mauvais garçom” (no Marais), o rapaz que servia (atenção: 'garçom' aqui não tem o mesmo siginificado!) me perguntou se era portugues a língua que eu falava. Quando lhe respondi, afirmativamente, seu rosto se iluminou. Queria saber o que siginificava “ PARE”, mas saiu sem a resposta para atender outra mesa. Retornou, logo que possível, tempo suficiente para eu lhe responder “STOP” (como os franceses escrevem nos cruzamentos das ruas). Com um ar entre surpreso e decepcionado, saiu rápido pois ainda haviam várias mesas para serem atendidas. No decorrer da noite, eu o flagrei me olhando como a dizer que voltaria. Tinha esquecido, quando ele reaparece sorridente (a casa estava mais vazia)e se abaixa para falar ao meu ouvido, susurrando entre gemidos:“ Pare! Pare! Pare!”. Entre risos, num clima de inusitada cumplicidade, expliquei-lhe que dito daquela maneira, na circunstância, significava exatamente o contrário, que ele devia prosseguir! Foi com uma carinha de feliz que ele se despediu. Fiquei imaginando se ele estava indo ao encontro do seu amante. Certamente, brasileiro!

Um comentário:

hugo medina disse...

Eita, eu tenho uma coleção de garçons que me faz companhia pelos bares da vida. Não é para sentar no divã do alnalista, nem para ser analista, mas para dar umas boas gaitadas. O Manoel, futuro pastor de igreja evangélica (por ai se tira), cujo nome será "Igeja vem que dá" é tão brilhante quanto o sol das minhas antigas quarta-feiras. Aliás, ele sempre pergunta por voce. Ao que eu respondo de proto: ela é muito europeizada, odeia praia. bjim