setembro 22, 2008

escândalo

Amanheci fazendo buscas para atender aos “engenheiros” que necessitavam do “manual do proprietário” do apartamento. Comecei resistindo, achando que nunca tinha sequer visto tal manual.Um pouco por preguiça. Mexer neste tipo de coisa não termina quando a gente encontra o que procurava. Vamos relendo e concluindo que metade daquilo não precisava estar guardado...e haja rasgar papéis inúteis. Desta vez, até que valeu remexer nesta papelada.
Encontrei o folder da peça UM PORTO PARA ELIZABETH BISHOP , de 2001, escrita por Marta Góes (especialmente para Regina Braga), sobre a passagem da poetisa norte-americana Elizabeth Bishop (1911-1979) pelo Brasil, nas décadas de 50 e 60.De lá tirei este texto do José Possi Neto que fez a direção:
escândalo
É impossível escandalizar nos dias de hoje.
Talvez porque o escândalo tenha se tornado status quo.
O escândalo hoje está somente ligado ao crime, à violência, à injustiça social.
Nas décadas de 50 e 60 , quando o Brasil ficou moderno, uma mulher com saias acima dos joelhos escandalizava, um homem que usasse sapatos sem meias ou uma camisa vermelha escandalizava , fazer amor antes do casamento escandalizava, fazer sexo fora do casamento também escandalizava , o Rock and Roll foi um escândalo, a BOSSA NOVA foi um escândalo impensável, a construção de Brasília foi um escândalo assim como a construção do aterro do Flamengo também foi um escândalo.
Falar de Elizabeth Bishop e Lota Macedo Soares é falar de um tempo onde o escândalo estava ligado à LIBERTAÇÃO e à CRIATIVIDADE , à quebra de regras ortodoxas , à quebra de preconceitos , à criação de um mundo novo voltado para a liberdade e o progresso .
Essas duas mulheres viveram intensamente o seu tempo e se impuseram como um casal na sociedade carioca nos anos 50/60. Lota assumiu cargos junto ao poder político da época , Bishop se inscreveu entre os maiores poetas americanos do século XX.
Ambas deixaram uma obra, Bishop sua poesia e Lota o aterro do Flamengo , que segundo Bishop, foi “o poema que Lota construiu para compartilhar com todos os cariocas “.
Lutaram com Homens num mundo dos Homens.
Viveram uma grande estória de anos, que terminou tragicamente com o suicídio de Lota aos 57 anos , e escreveram seus nomes no elenco dos personagens ícones da libertação da mulher .
Portanto falemos, falemos muito sobre Elizabeth Bishop e Lota Macedo Soares , ao falarmos dela estamos falando do Brasil , de sonhos ideais , de cruéis realidades e acima de tudo de LIBERTAÇÃO”


Sobre Elizabeth Bishop :
Nascida em Worcester, Massachusetts, foi uma pessoa "sem porto" durante muito tempo, até que aceitou o convite de Mary, então namorada de Lota Macedo Soares, para visitar o Rio de Janeiro, em 1951.
Apaixonando-se por Lota e pelo Brasil, aqui viveu e produziu parte de sua obra durante 18 anos. Ganhou o Prêmio Pullitzer de poesia em 1956.
Após o suicídio de Lota, em Nova Iorque permaneceu nos EU. Foi professora titular de poesia em Harvard, em 1969. Dependente de álcool,asmática, depressiva, expatriada, cheia de conflitos e extremamente interessante.

FLORES RARAS E BANALÍSSIMAS - A história de Lota de M. Soares e Elizabeth Bishop de autoria de Carmen L. Oliveira
Faz quase uns dez anos que li (recomendado e emprestado pelo Vagner) este livro maravilhoso que conta a história do amor entre a Bishop e Lota, tendo pano de fundo do Brasil dos anos 50 e 60.
Os primeiros tempos de vida em comum, junto à mata de Samambaia, foram de grande felicidade.Assumiram sua homossexualidade com surpreendente naturalidade para a época. Bishop escreveu alguns de seus mais marcantes poemas, conseguindo se afastar do alcoolismo.
Em 1961, Lota embarcou no ambicioso projeto de idealizar e administrar a construção de um parque à beira-mar, no aterro do Flamengo. O casal teve que se mudar para o Rio. A visão urbanística de Lota feria interesses e seus conceitos de lazer e estética não encontravam ressonância na burocracia e na política. Lota foi-se ausentando cada vez mais de casa e, com imenso desgaste, canalizando suas energias para superar os obstáculos sistematicamente colocados pelos que consideravam seu plano visionário.
Bishop, antes apaziguada na casa na neblina, viu-se só, no burburinho da cidade grande. Seu melhor depoimento sobre a cruel transição entre a exuberância natural de Samambaia e o terror urbano está em seus poemas, nos quais a bromélia é substituída por uma cadela sarnenta e, em vez das imagens sensuais da vida natural, surgem putinhas dançando o chácháchá nas calçadas de Copacabana. Bishop recaiu no alcoolismo.
A obsessão de Lota pela conclusão do parque e a crescente instabilidade emocional de Bishop contribuíram para que ambas enfrentassem uma forte crise em sua vida amorosa, agravada pelo tumulto da época, com a instalação da ditadura e o fim político de Lacerda.
Os retratos nuançados de Lota e Bishop, bem como a reconstituição impecável do momento histórico, custaram a Carmen L. Oliveira muitos anos de pesquisa em documentos inéditos, correspondência das protagonistas, a obra de Bishop, ofícios de Lota, diários, agenda pessoal, jornais, revistas e depoimentos de confidentes. Daí emergiu uma história sensacional, envolvendo pessoas extraordinárias, como José Eduardo de Macedo Soares, D. Baby Lage, Carlos Lacerda, Roberto Burle Marx, Rachel de Queiroz e Alexander Calder, todos personagens do livro.
Flores raras e banalíssimas é para quem gosta de uma boa história e de História.

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