Ninguém diria hoje que ser velho equivale a estar doente, apesar de nenhum remédio poder evitar os cabelos brancos e as rugas, nem a perda de agilidade e de vigor. Envelhecer não é um imperativo da evolução, mas um processo alterável. Seria possível retardá-lo muito? Inclusive evitá-lo? São perguntas que até há pouco tempo ficavam no plano da fantasia, mas hoje geram pesquisas de primeira linha.
As descobertas dos últimos anos fizeram com que até os cientistas mais ortodoxos, que vêem na proliferação das terapias antivelhice apenas um produto de marketing, se perguntem como podem prolongar a vida humana.
O envelhecimento biológico não é uma conseqüência inevitável da passagem do tempo. Há evidências, segundo os pesquisadores de que não é obrigatório envelhecer, do ponto de vista evolutivo: “ O envelhecimento não é como a mudança da dentição, que claramente traz vantagens, ou a puberdade, que prepara o organismo para se reproduzir. Para a evolução, dá na mesma que nos apareçam cabelos brancos e rugas. Daí se deduz que o envelhecimento não é imutável.”
No entanto, talvez a maior mudança ainda esteja por vir. Segundo a revista "Nature", "a questão não é se a duração média da vida humana aumentará modestamente nas próximas décadas. Isso acontecerá quase com certeza. A questão é, principalmente, se é factível adiar o envelhecimento humano e a morte natural por muitas décadas, inclusive de forma indefinida".
Décadas de vida a mais? Imortalidade? Parece ambicioso, mas os autores deixam claro que sua análise não tem nada a ver com as terapias antienvelhecimento atualmente em voga. Eles partem de uma pergunta muito básica: por que a partir de certa idade o organismo começa a funcionar de modo menos perfeito? A resposta está na evolução.
"O envelhecimento não é um programa genético selecionado e conservado pela evolução; seria mais um colapso do organismo". O envelhecimento ocorreria por defeito, por assim dizer, e não porque confira uma vantagem ao indivíduo.
Há vários argumentos. Um é que “o envelhecimento é muito raro na natureza. Outro é que, no caso de envelhecer, isso acontece depois que o indivíduo se reproduziu e criou sua descendência, e, portanto o que lhe acontecer a partir desse momento não terá transcendência (em termos genéticos, não será transmitido a nenhum descendente). "Para a evolução, os velhos não importam".
O que acontece com um corpo que envelhece? Quais são os mecanismos biológicos que contribuem para seu colapso? Vale a pena descobrir isso, principalmente se quiser combater esses mecanismos. Além disso, há aqui um elemento interessante: a relação do envelhecimento com a doença. Ganha força a idéia de que as doenças mais freqüentes na idade avançada, como o câncer ou o Alzheimer, são faces diferentes de um mesmo problema: o envelhecimento. Isso implica que convém elucidar a biologia do envelhecimento para atacar conjuntamente doenças que hoje são pesquisadas em separado.
"As mudanças biológicas que nos predispõem a doenças fatais e incapacitadoras são causadas pelo processo de envelhecimento. Por isso devemos transformar em prioritárias as intervenções para retardar esses processos. Aceita-se em geral que o organismo vai acumulando danos, por exemplo, no material genético das células, na medida em que passa o tempo. São danos devidos a processos como a liberação dos famosos radicais livres, inevitável subproduto de nossa respiração.
E agora a grande pergunta: quais são as possibilidades reais de conter ou mesmo reverter o envelhecimento? Os autores do artigo de "Nature" lembram que hoje se conhecem centenas de mutações genéticas capazes de prolongar a vida - às vezes em até 40% - em lagartas, levedos, moscas da fruta e ratos.
São genes envolvidos no crescimento, no metabolismo, na nutrição e na reprodução. Muitos têm efeitos bioquímicos semelhantes aos que são provocados por um comportamento que, segundo já sabe há um século, prolonga a vida dos ratos no laboratório: a restrição calórica. Isto é, comer muito pouco, mas sem cair na desnutrição.A restrição calórica é de fato a única coisa que, fora as manipulações genéticas, se mostrou eficaz em ratos - não em humanos - para prolongar a vida.
Seria possível conseguir resultados igualmente interessantes com pessoas?
Ninguém sabe. E a manipulação genética? Os autores do citado artigo advertem que o aumento da longevidade devido a mutações é menor na medida em que aumenta a complexidade dos organismos. Talvez nos seres mais complexos os circuitos genéticos envolvidos no prolongamento da vida sejam regulados por outros circuitos ainda desconhecidos.
Para tornar realidade algo assim seria preciso primeiro resolver também o problema do cérebro: os neurônios que armazenam as recordações, as experiências vitais, não se regeneram. Quem gostaria de ter um cérebro jovem, mas em branco?
Assim, os cientistas da "Nature" respondem com um "ainda não sabemos" à pergunta de se o homem poderá um dia ser imortal, mas mostram-se otimistas em relação à possibilidade de ampliar nossa existência e também conseguir que seja melhor.
É ter paciência. Os que acreditaram na fonte da juventude estão esperando até hoje!
Trecho de "Contendo a velhice" do El Pais.
Um comentário:
Se se chegar a conclusao que o envelhecimento é imutável,porque manter uma função já cumprida?
A eternidade neste caso deve ser muito chata!
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