abril 04, 2008

PAULO FRANCIS




"Todo livro poderia ser reduzido em 50%, na minha opinião, e mesmo os melhores em média só são legíveis em 20%. Debussy ouvia os leitmotivs de Wagner e dizia: "Vamos embora que ele vai começar a desenvolver".Certo. Uma das minhas grandes dificuldades com romances é o negócio das descrições de ambientes. Não é que eu prefira o visualismo (passivo, objetal) que o cinema ou TV impõem ao espectador. É que não me interesso pela casa das pessoas. Havendo uma poltrona que agüente meu peso e tédio, ar-condicionado, álcool e gelo, dou-me por satisfeito. Se eu não esculhambasse fisicamente a maioria dos meus livros diria até que sou um bibliófilo. Gosto de livro novo, do papel, do tipo, daquele barulhinho que faz quando abre. E o primeiro parágrafo é sempre o maior barato. Tenho a impressão de que, enfim, vou encontrar a verdade. No segundo parágrafo, já sei que não, mas, que diabo, o importante é competir". (Paulo Francis, “Bomba, bomba, bobagem”, Paulo Francis nu e cru, 1976).

Paulo Francis , nasceu no Rio de Janeiro em 1930, foi talvez o mais conhecido, temido e influente jornalista brasileiro das últimas décadas. Lançado em 1980 e, recentemente, reeditado O afeto que se encerra é uma mistura de memórias pessoais e profissionais. e traz uma ternura (afeto?) que prova que Francis não era só virulência: havia também o homem sossegado, que preferia ignorar os detratores a dar voz a eles, que assumia erros e pedia desculpas por tê-los cometido.
O afeto em que se encerra - trecho
“A perturbação é mais decisiva que o tédio. Como tantos que escrevem, não gosto de escrever, mas me sinto infeliz, mais do que o habitual, se não escrevo. Sou, como disse, ambicioso, pessoalmente, não resisto à vontade de me destacar, essa vulgaridade em que me confesso "viciado", e porque me realizo espiritualmente no trabalho. Há muito pouco na vida que se compare ou dure tanto com e como a sensação do dever (que nos impusemos) cumprido. Fui dotado de uma capacidade de trabalho, verdadeiramente elefantina. Perco a consciência de mim mesmo, esse miserável feixe de nervos e sensações que é o ser humano, elevando-a, paradoxalmente, ao pôr no papel o que me interessa. Não gosto de fama, aquela em que nos apontam o dedo na rua. Me agrada ser conhecido, respeitado e, principalmente, não humilhado.”

Francis foi ator e crítico de teatro que chegou ao limite da agressão física por seus veredictos demolidores, editor de saudosos e, infelizmente, efêmeros suplementos culturais, editorialista anônimo que provocou quedas de gente de alto escalão em plena ditadura, ensaísta que utilizou sua bagagem, aparentemente ilimitada, para desenvolver longos textos,comentarista dos principais telejornais do Brasil e, por fim, o hilário debatedor do Manhattan Connection.

Além de duas memórias (O afeto que se encerra e Trinta anos esta noite) e inúmeras coletâneas de artigos, publicou os romances Cabeça de papel e Cabeça de negro e as novelas Filhas do segundo sexo.Foi um dos fundadores d'O Pasquim e,a partir de 1975, publicou a coluna Diário da Corte em diversos jornais.Depois de ter sido preso, preferiu se refugiar em Nova York, onde viveu até sua morte, em 1997, de um ataque cardíaco.

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