dezembro 27, 2013

LORE



"Assistir a dramas históricos é sempre uma experiência interessante, principalmente quando o período retratado é polêmico ou envolto em grandes discussões. Lore (2012), da diretora australiana Cate Shortland é um desses filmes. O cenário da obra é a Alemanha no fim da Segunda Guerra Mundial, e o roteiro, que é a adaptação do romance The Dark Room, de Rachel Seiffert, é focado na vida de uma família que é obrigada a ir para o interior da Alemanha, em fuga dos soviéticos, britânicos e americanos.
A família de Lore, a filha mais velha e protagonista da história, é uma típica família nazista, com filhos da Juventude Hitlerista, pai Oficial e mãe engajada à causa nacional. Esse cenário ideológico de abertura é trabalhado a contento pela diretora, e desse ponto, partimos para uma jornada cujo foco principal não é discutir política ou ideologia, mas as condições de uma família, seus valores e meios de sobrevivência num país que passa de um governo extremo para outro modelo de administração.
O fator histórico nunca se afasta da linha narrativa, sendo tudo e todos afetados pelas consequências do final da guerra (em dado momento tive a leve impressão de que revia uma cena de Alemanha, Ano Zero), mas é o fator humano que ganha destaque na tela, partindo de uma organização familiar complexa – considerando sentimentos e obrigações ideológicas – e terminando com o surgimento de outros sentimentos e ausências, como a paixão de Lore por Thomas e a morte do pequeno Gunter.
Nessa miríade de sentimentos e companheirismo, a fotografia de Adam Arkapaw aparece como uma gélida e opressiva atmosfera, dando à maior parte dos quadros uma aparência azulada, com raros momentos de predominância para outras cores. Essa identidade fotográfica não só ajuda a intensificar a realidade fria, profunda e depressiva que marca a jornada dos cinco irmãos mas também dá sustentação à personalidade de cada um, como uma extensão de sentimentos angustiantes, muitas vezes complementado pelo verde ou cores mais escuras, sempre tomando quadros de importância chave do filme ou colocados como respostas dramáticas anunciadas, a exemplo da parede de moinhos azuis na casa da avó.
Se a história tivesse apenas os irmãos como objetos de interesse narrativo, o resultado final certamente seria muito melhor, mas não é que acontece. Em dado momento da história, temos a apresentação de Thomas, um personagem que ganha importância notável no roteiro, dando um outro significado à caminhada do grupo de irmãos e trazendo grande riqueza para a discussão dos elementos históricos da obra. Mas eis que esse mesmo personagem é afastado bruscamente do filme na reta final, e o que vem depois disso é um fechamento decadente de uma história que até aquele momento ia muito bem.
Mesmo que o destino de Thomas fosse se afastar de seus “irmãos adotivos”, o ideal seria que esse afastamento fosse realizado de maneira menos anticlimática, de modo que o restante da película não ficasse vazia por ele não estar em cena, mas que houvesse sim o sentimento dramático de sua falta. O que acontece na reta final de Lore é justamente a primeira colocação. Sem Thomas, e com a chegada do grupo à casa da avó, a jornada perde significado, tendo pequenos resquícios de consequências, mas nada que conseguisse dar força para um final digno da história contada.
A diretora finaliza a caminhada de Lore e seus irmãos com uma cena mista de sutileza e fraqueza narrativas, mantendo o clima da reta final, após a ausência de Thomas na cena de inspeção do trem. Lore é um filme bem realizado, com um argumento e indicações estéticas ligadas à percepção pessoal de um grupo de irmãos criados em um mundo e uma família nazista, mas essa história se desvia para um caminho do qual não consegue voltar e é finalizada desprendida de seu argumento inicial, solta e imprecisa. Mesmo assim, a experiência e as discussões são válidas, não deixando que a sessão se torne uma perda de tempo. Mesmo não sendo um grande filme, vale a pena conferir".

Plano Crítico 

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