setembro 19, 2013

Medos


"Angústia é medo. A origem grega da palavra significa "aperto", coisa que nos acontece no peito (e em outras partes) quando o medo bate.
Há medos que já vêm embutidos em nossos programas de base, inscritos no cérebro pela genética, frutos de antepassados que viveram o bastante para procriar, e foram os medos que os salvaram.
Esses medos de raiz (escuridão, confinamento, altura, insetos voadores, répteis -cobra, principalmente) não se desligam.
Coisas muito mais perigosas, como automóveis, não produzem medo algum, apesar de eu nunca ter conhecido ninguém que morreu de cobra, e vários que morreram de acidente de carro e moto.
Mas sabê-los parte da natureza humana é muito útil. Escuro, por exemplo. Achar que o certo é a criança dormir sozinha no escuro de seu quarto, e que, se ela tiver medo é porque tem problemas, é um erro.
Serviu para os britânicos que não podiam se apegar às famílias, para servir nas colônias. Até então a humanidade dormiu junta, perto do fogo.
Por isto, vai minha forte recomendação: dê direito de abrigo a seu filho no seu quarto, se ele acordar com medo durante a noite. Num colchonete ao lado, que criança na nossa cama é um aborrecimento.
Outra: se você acordar durante a noite, não pense em problemas nem em providências para o dia seguinte. Eles são muito piores no escuro. Trate de pensar em algo agradável, como um devaneio erótico.
Mas a cultura sofisticou nossos medos em novas formas. Temos medo da ameaça física, da vergonha moral, do ridículo, do banimento social, da perda do amor das pessoas queridas, das "sifudências" em geral (virar velho pobre, por exemplo), da nossa autocrítica, da morte imaginada (sempre pior que a real), e do sentimento de culpa.
Este último merece um olhar especial, pois se transformou no instrumento de dominação mais eficiente que a espécie já inventou.
Você pode fazer com que alguém se ajoelhe sob a ameaça de um revólver. Mas com a culpa, você fará com que a pessoa peça para se ajoelhar diante de você. Imbatível!
O que é o sentimento de culpa? Para tê-lo, precisamos trazer na cabeça modelos e antimodelos. Ideais de perfeição a que deveríamos atingir, e horrores absolutos de seres que são o fim da picada.
É preciso ter crenças irrealistas, portanto, que nos fazem ficar sempre devendo ao mundo e ameaçados de nos parecer horríveis.
Pense numa mulher que tem na cabeça a mãe ideal (modelo) e a mãe desalmada (antimodelo). A primeira é inatingível. E se trabalha fora, então? Ela vai se imaginar a desalmada, o horror absoluto, e vai tentar "compensá-los" quando chegar em casa.
Os filhos detectam essa fragilidade e passam a abusar desse poder enorme que têm sobre elas, tornando as mães em seus videogames favoritos, fazendo assim que ela perca a mais importante ferramenta da educação, a autoridade.
Podem argumentar que é o amor. Conversa fiada. Primeiro vem a autoridade, depois vem o bom gerenciamento. Eles abrem espaço para sentir amor, pois o que se faz por culpa é penitência (para alívio da culpa), não é amor".

Francisco Daudt

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