“Meu nome é Serena Frome (a pronúncia é Frum) e há quase quarenta anos fui enviada numa missão secreta do Serviço de Segurança britânico. Eu não voltei em segurança. Um ano e meio depois de entrar fui despedida, depois de ter caído em desgraça e acabado com a vida do meu namorado, embora ele certamente tenha tido um pouco a ver com sua própria queda”. (trecho em PDF)
A estória de Serena se desenrola na primeira metade dos anos 1970, em plena contracultura, Guerra Fria, bomba atômica, avanço do feminismo, quando parlamento e sindicatos contribuíam para que o sentimento geral fosse de perplexidade e insegurança no Reino Unido.
Filha de um Bispo anglicano frio e distante (ela o tratava por Bispo), viveu uma infância privilegiada e superprotegida. Seu sonho de cursar letras foi alterado por sua mãe, por temer que a filha se tornasse uma simples dona de casa. Serena, mesmo contrafeita, vai estudar matemática em Cambridge...
"Desde o sucesso do romance Reparação, a expectativa gerada por um lançamento de Ian McEwan é sempre imensa. Serena pode ser o livro que mais corresponde a essa expectativa, não só por se tratar mais uma vez de uma personagem feminina que revê um momento histórico relevante (aqui, o começo da década de 70), mas, sobretudo, por permitir que o leitor reviva a discussão sobre os limites da literatura como reelaboração da realidade.
Ao ser contratada pelo MI5, o Serviço Secreto Britânico, a protagonista Serena se vê como participante de uma mentira cujo objetivo é fomentar a criação de uma ficção. Isso porque ela é incumbida de estabelecer contato com um escritor a quem não pode contar que é uma espiã, nem que o dinheiro que ele passará a receber virá do Estado. Mas o contexto de toda essa armação é uma guerra muito real, num período bastante violento da história da Inglaterra, especialmente por causa da atividade do IRA.
E, para Serena, o caso envolve ainda sua vida pessoal, tanto no que se refere a seu antigo amante, que a introduziu no MI5, quanto no que se refere ao escritor que é vítima do ardil, por quem acaba se apaixonando. Ela é, portanto, agente e vítima, personagem e criadora, num romance em que todos esses papéis são questionados com fervor.
Ora, ao conhecermos a ficção de Tom Haley, o escritor que não sabe que está na folha de pagamento da Inteligência Britânica, já notamos essa curiosa relação entre o real e o fictício, mediada pelo criador. Mas será apenas quando concluirmos a leitura de Serena que teremos a verdadeira dimensão do grau que atingiu essa fusão, tanto na história que estamos lendo quanto na nossa relação com o livro e seus personagens.
A literatura experimental, questionadora, pode adotar várias máscaras. Nesse romance, Ian McEwan a veste nos trajes mais discretos e, talvez por isso mesmo, mais eficientes".
( resenha )
E parece querer dizer: não importa a posição política que se adote, não importa o quanto se grite por liberdade. O grito, tanto do escritor como do leitor, é sempre sufocado. Neste final surpreendente, nos prega uma peça não encerrando a estória, mas contrapondo os espelhos que refletem seu começo.
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