fevereiro 27, 2012

Presidentes de estilo próprio

"Um presidente francês que prefere Coca-Cola a vinho, participa de jantares oficiais em 45 minutos e geralmente acha que toda a história da comida na França é um exagero, pode ser reeleito? Diante disso, você teria de dizer não. Qualquer presidente da República da França segue as pegadas de Charles de Gaulle e, por isso, carrega o peso implícito de encarnar não apenas o Estado, mas aquela "França profunda" onde a cozinha e a própria vida são inseparáveis.
Nicolas Sarkozy, mesmo no modo menos agitado, criado por sua mulher, Carla Bruni, nunca fez realmente essa conexão. Ele se distancia da própria imagem da França: um homem urbano, cosmopolita, de fala rápida e pensamento ágil, que parece confortável nos Champs Elysées, mas não em qualquer campo onde possa aparecer um boi ou um bode.
Talvez nessa era sem fronteiras do Twitter, o mito nacional e a própria imagem devam ser coisa do passado. Por que se deve esperar que um presidente francês seja ligado ao campo e seus produtos, ou um presidente americano tenha a cabeça cheia de cabelos e acredite na missão nacional conferida por Deus? Bem, essas coisas são profundas: a política e a razão estão a certa distância uma da outra.
Na verdade, Sarkozy e Obama, dois presidentes que enfrentam eleições este ano, têm alguns problemas iguais. Existem os superficiais -alto desemprego, crescimento hesitante, deficits orçamentários, desigualdade crescente. E depois há a questão central: nenhum deles encontrou uma maneira de se conectar com a nação de modo a levantar o moral ou gerar a convicção de um futuro melhor.
Essa é uma tarefa mais difícil na França, cujo modo reflexo é o mau humor, do que nos Estados Unidos, onde o otimismo é a linha básica. Mas os franceses, como os americanos, mantiveram sua distância do presidente nos últimos anos. Na França, com Sarkozy, é sobretudo uma questão de vulgaridade percebida. Nos EUA, uma questão de tranquilidade percebida. Em algum ponto entre essas percepções há preconceitos mais profundos. Na França, uma visão de Sarkozy como parvenu, ou arrivista. Nos EUA, toda a besteira sobre Obama ser muçulmano ou um socialista europeu reflete parte da repugnância reprimida de seus adversários pelo fato de ele ser afro-americano.
Mas a coisa sobre os dois líderes é que, mesmo que algumas pessoas sintam uma simpatia instintiva por eles, muitas têm de admitir em seus momentos privados de resmungos que eles conseguiram fazer muito em circunstâncias difíceis. Com raras exceções, eles não amam Sarkozy ou Obama. No entanto, não podem rejeitá-los como incompetentes.
Sarkozy reformou as universidades francesas e o sistema de aposentadoria contra grande resistência; ajudou de modo decisivo na libertação da Líbia da tirania; trouxe a França de volta para o comando integrado da Otan e assim permitiu a operação líbia; rompeu tabus paralisantes ao declarar uma verdadeira admiração pelos EUA e por sua ética do trabalho; e principalmente salvou a França e a Europa do precipício, colocando a Alemanha a bordo para salvar o euro.
Sua campanha optou por retratá-lo como o homem que se ergueu entre a França e a catástrofe. É um pequeno exagero, mas o papel positivo de Sarkozy na crise do euro não deve ser desconsiderado.
Do outro lado da água, Obama levou os EUA do choque da fusão de 2008 para o primeiro brilho tênue de recuperação econômica. Matou Osama bin Laden e, com ele, removeu o apelo carismático da Al Qaeda. Ninguém mais fala sobre uma guerra ao terrorismo; simplesmente parece tolice. Obama também extricou o país do Iraque, definiu um rumo para a saída do Afeganistão e se ergueu por trás da maior onda de libertação desde 1989, a chamada Primavera Árabe. Se é verdade que ele não se conectou, não se pode dizer que não atuou.
Tais conquistas serão suficientes para garantir a reeleição dos dois homens não amados por seus cidadãos? Talvez sejam, em parte, porque uma eleição também tem a ver com alternativas verossímeis.
Na França, François Hollande, o candidato socialista, é muito mais conforme a imagem convencional do que deveria ser um presidente: um homem que veio das escolas certas, intelectual, culto, bom escritor, produto de uma família burguesa normanda que representa uma região da França mais profunda.
Ele emagreceu para a eleição, mas ninguém duvida de seu amor pela boa comida. Entretanto, parece ser um homem que vacila no aperto. As pessoas se perguntam se ele realmente é capaz de governar.
Quanto ao circo das primárias republicanas nos EUA, só deixou uma certeza: é um campo fraco, sem um candidato convincente. Além disso, Sarkozy tem uma fraqueza por sopa de alcachofra com trufas. E Obama tem uma cabeça cheia de cabelos, embora ficando grisalhos".
ROGER COHEN  de Londres

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