fevereiro 18, 2012

Perto do mundo, longe do Carnaval

"Não que eu compartilhe desse sentimento, não mesmo, mas, se você sente ódio pelo Carnaval, pelos sambas, frevos e marchinhas, pela atitude folgazã, se, durante o período de folia, você gostaria de morar em outra galáxia, de preferência numa dimensão alternativa, não se desespere, porque a solução está no seu bolso: o telefone celular.
Calma. Não estou propondo nenhuma maratona insana em que, ao primeiro ataque dos tamborins no sambódromo, você saia ligando como louco para toda a lista de contatos do telefone móvel e, destroçando as cordas vocais, fale sem parar até a Quarta-Feira de Cinzas. Nada disso.
O tema aqui é uma equação muito simples, que tem embalado boa parte de minha vida nos últimos meses. Acho que ela pode ser útil também aos "Momo haters". A fórmula: celular + internet = rádio. E não um rádio qualquer -um rádio aberto para o mundo, para todos os sons, todas as línguas, em todos os fusos horários, que vai levar você para longe, bem longe do país dos sambas-enredos e do Carlinhos Brown.
Mas, antes do caminho das pedras, um segundo de nostalgia. Ondas curtas, alguém se lembra? Eu me lembro, e como. Eram as únicas frequências de rádio que, a duras penas, conseguiam cruzar o planeta. Para moleques ávidos por novidades, em algum ponto do século passado, eram o caminho para saber o que tocava nas rádios estrangeiras.
Quer dizer, mais ou menos. Porque o que chegava ao Brasil não eram exatamente as estações de outros países -eram os serviços voltados para a América Latina dessas rádios. Mas já dava para o gasto.
O serviço brasileiro da BBC de Londres, as transmissões em espanhol da Rádio Moscou (na era soviética, propaganda comunista chegando ao Brasil da ditadura!), a Rádio França Internacional em português, rádios estatais da China, da Coreia do Sul, da Suíça...
Em teoria, perfeito. Só que não era tão fácil assim. Ainda mais morando em São Paulo. O ouvinte paulistano de ondas curtas sofria com interferências impiedosas, sinais que iam e vinham. E pior ainda: as frequências mudavam a cada semana -por alguma razão técnica, as rádios se deslocavam constantemente pelo dial. Era um sofrimento encontrar a estação preferida.
Assim, tendo passado tantos anos da juventude às voltas com a precariedade das ondas curtas, não é com pouca alegria que me tornei usuário, praticamente um dependente, dos aplicativos para celular que sintonizam rádios estrangeiras. Adiós, ondas curtas. Bem-vindas, rádios pela internet móvel!
Há dezenas de aplicativos. O que eu uso, grátis e muito fácil, consegue captar, literalmente, cerca de 50 mil estações!
Se tem uma rádio estrangeira de sua preferência, basta escrever o nome dela no campo de busca. Rapidamente, supondo que sua cidade tenha um sinal de celular OK, você vai viajar nos sons da web.
De novo, para quem sofreu com as ondas curtas, é uma alegria sem fim correr na lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, ouvindo a BBC 6, de impecável programação musical.
Ou se exercitar no parque Villa-Lobos, em São Paulo, e até esquecer a medonha vista para a marginal Pinheiros, concentrado na seleção roqueira da KEXP, de Seattle.
Ou, ainda, voltar do trabalho muito tarde da noite, sintonizar a KCRW, de Los Angeles, onde ainda é final de tarde, e escutar "All Things Considered", o excelente noticiário da NPR, o sistema público de rádio dos EUA. Tudo ocidental e óbvio demais para você? Sem problemas: ouça a Triple J, animadíssima rádio australiana de rock, pop, entrevistas, notícias e o que mais aparecer.
Essas são as quatro que mais escuto, por isso as citei. Mas não passam de uma gota ínfima em um oceano de possibilidades sonoras.
Pronto, a rota está dada. Despeça-se para sempre do Rei Momo. Diga um adeus definitivo à euforia do sambódromo carioca, à doideira dos blocos de Salvador. Esqueça a fuzarca que a turma de bagunceiros está fazendo na casa que alugou ao lado da sua, nem esquente com o batuque de desocupados no boteco da esquina.
Aplicativo baixado, fones nos ouvidos e, pronto, acabou o Carnaval. Pelo menos para você. Porque, como escrevi lá no começo, eu gosto de acompanhar a folia, mesmo que de longe. Meu celular pode esperar até a Quarta-Feira de Cinzas".

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR

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