"Envelhecer é uma dor que só pode ser entendida por quem envelhece. Ao lado do fato biológico, ao qual é subordinado por um determinismo, o ser humano, na sua incompletude e imperfeição, também foi dotado de uma consciência da vida que torna absurdos o envelhecimento e a morte.
Sendo um fato natural, um inevitável ciclo biológico, envelhecimento e morte deveriam ser prazenteiros como os demais, a alimentação, o amor, a procriação. No entanto, doem, machucam, parecem absurdos, principalmente porque o ser humano envelhece no corpo sem ter alimentado o espírito de todas as necessidades por ele reclamadas. Uma espécie de fome, sempre atrasada, perdura com ele: ela precisa ser saciada depois. Precisa ser saciada um dia. Mesmo quando tudo pareça indicar que não dá mais. E quem se recusa a envelhecer e se insurge contra o absurdo do corpo ir caindo quando o espírito ainda é jovem e a mente esplende, ainda tem contra si o risco do ridículo, do deboche e do escárnio de quem só quando começar a envelhecer saberá o quanto doi e o quanto havia, até de méritos, na atitude que se rebelava contra o absurdo incrustado no determinismo de ansiar pelo infinito mergulhado na certeza da finitude, da morte.
Talvez seja porque todas as vidas que temos dentro não cabem em toda a nossa vida, como costumo sempre dizer. Todas as vidas que temos dentro, ficam clamando por viver, por ser experimentadas, por encontrar respostas no mundo. As vidas que levamos dentro medem a nossa juventude, não importa a idade. Daí, a dificuldade de harmonizar os impulsos em contradição, acotovelando-se para dominar o nosso ser. Daí o risco de se perturbar, de perder o senso da realidade.
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Artur da Távola - Críticas (Gaivotas) - link no título
Revista Amiga N° 481 - o8 de agosto de 1979.
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