"O QUE OBESOS MÓRBIDOS, ESPORTISTAS RADICAIS, alcoólatras, fetichistas por pés e religiosos têm em comum? Todos eles são animados pela mesma força motriz: o prazer.
E o que é o prazer? É difícil dizer. Embora tenha desde sempre chamado a atenção dos filósofos -Aristipo de Cirene, um dos discípulos de Sócrates, fundou a primeira escola hedonista no início do século 4º a.C.-, foi só nas últimas décadas que a ciência reuniu os recursos necessários para investigar o fenômeno a fundo, permitindo a elaboração de hipóteses que avançam para além do terreno puramente especulativo.
Estamos assistindo ao surgimento da ciência do prazer.
(...)
MOLÉCULA DO PRAZER As zonas do cérebro então identificadas como centros de recompensa foram o sistema límbico e o "nucleus accumbens", cujos neurônios têm numerosos receptores para o neurotransmissor dopamina, a "molécula do prazer".
Seria um erro considerar o prazer como um tempero, mero adjuvante na busca de comida e parceiros sexuais. É uma das principais forças que nos faz agir. Sem ele, não teríamos motivação nem para descer das árvores toda manhã. Não por acaso, a anedonia, perda da capacidade de sentir prazer, é um traço comum de várias doenças mentais.
O prazer age primordialmente por vias emocionais, bem mais eficientes e rápidas do que as racionais. Hamlet pode ficar imobilizado pela dúvida existencial, mas quem se depara com um urso sente medo e sai correndo sem pensar, preservando os seus genes para futuras gerações.
E por envolver a aprendizagem, o prazer garante jogo de cintura para adaptar-se a eventuais mudanças no ambiente. O animal que gosta de frutas doces tem mais chances de dar-se bem do que o bicho que extrai seu quinhão de frutose exclusivamente de amoras, por exemplo.
Os estudiosos fazem a distinção entre os prazeres fundamentais (sensórios, sexuais e sociais) e os de ordem superior (monetários, artísticos e transcendentais). Em princípio, partilharíamos os primeiros com outros animais. Já os últimos seriam exclusividade humana.
(...)
ÉTICA No fundo, tinha razão Epicuro (341 a.C.-270 a.C.), um dos primeiros filósofos hedonistas. Sem rejeitar o prazer, ele percebeu a necessidade de enquadrá-lo dentro de uma ética. Poderíamos até dividir a história da filosofia em sistemas ou autores que nutrem simpatia pelos apetites naturais (hedonismo, empirismo, Diderot, utilitarismo) e aqueles que os denunciam como fonte dos males humanos (estoicismo, santo Agostinho).
O que a incipiente ciência hedônica sugere é que o prazer, mais do que um impulso a ser disciplinado, é uma das principais forças que dirige a formação do cérebro e que nos confere o gosto pela vida. Compreender os caminhos por vezes estranhos a que ele nos conduz é o primeiro passo para uma nova ética do prazer, que nos permita evitar suas armadilhas e utilizá-lo para tornar mais eficientes práticas como a educação e tratamentos de doenças."
Nota: Para ler a íntegra do texto de autoria de HÉLIO SCHWARTSMAN link no título.
Nenhum comentário:
Postar um comentário