março 07, 2010

"O Absolutismo - A Ascensão de Luís XV" e "O Amor"


"Roberto Rossellini foi muito claro ao dar o título: "A Tomada do Poder por Luís 14". Se a Versátil o apelida no Brasil de "O Absolutismo - A Ascensão de Luís XV" por razões comerciais, para explorar um filão, digamos, pedagógico, muito bem: o dano terá sido pequeno para que enfim possamos ver essa que muitos tomam como a obra-prima do grande mestre italiano.
O que se passa no filme, em poucas palavras, é o seguinte: com a morte de seu primeiro-ministro e mentor, o cardeal Mazarin, o jovem Luís 14 se vê cercado de problemas. Estamos em meados do século 17, quando as revoltas da Fronda acabam de ser contidas, mas ao preço de vários acordos políticos que os nobres agora dispõem-se a cobrar do jovem rei (e de sua mãe).
Ora, Luís não pode enfrentá-los pela força, mas pela habilidade. E ela consistirá justamente nisso: em colocar a corte sob direta dependência. O filme procede a um rico detalhamento dessa operação, que introduz seja a ideia de corte como a conhecemos ainda hoje, seja a própria moda como motivo central de um modo de vida.
Mesmo a etiqueta se torna algo tremendamente inflado nesse mundo que Luís sustenta à base de um colossal dispêndio (ele retira os recursos dos nobres, substituindo-os por generosas mesadas, em troca força-os a viver sob suas asas, no palácio de Versalhes, ao mesmo tempo em que, para sustentar esses luxos, desenvolve a indústria nacional).
Com essas e outras medidas, Luís consegue apaziguar seu reino e partir para a constituição de um império, tendo agora como principal conselheiro Colbert (sem relação familiar com Claudette Colbert, a atriz).
Essa é, em linhas gerais, a história. A particularidade do filme é Rossellini substituir a "grande história" por uma história da vida privada. Pois é mostrando como pensavam os médicos que viviam no século 17, introduzindo-nos aos rituais de poder (como o almoço com o rei), que Rossellini nos carrega para dentro da política das aparências, que, pelo jeito, o Rei Sol dominou melhor do que ninguém.
E dizer "política das aparências" não é um modo de rebaixar Luís 14. As aparências dizem respeito ao que aparece.
São como a pele: não significa que não haja nada por dentro e por trás dela. Mais do que tudo, sua identidade com o cinema -outra arte das aparências- é completa. E talvez seja isso que explique o fato prodigioso de Rossellini ter rodado essa maravilha para a TV, com um orçamento diminuto e em apenas 20 dias.
A mesma distribuidora lança, do mesmo diretor, "O Amor", filme com duas histórias, feitas para Anna Magnani brilhar, antes de mais nada. Ela brilha, de fato. É um belo filme (em especial a segunda história), talvez sem o mesmo alcance".

INÁCIO ARAUJO

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