maio 25, 2008

"QUEM TEM MEDO DE MÚSICA CLÁSSICA?"


Era este o nome do programa apresentado por Artur da Távola, na TV Senado, nas manhãs de domingo. Com seu amor e entusiasmo pela grande música, introduziu a mim e a muitas pessoas nesse seu mundo magnífico.
Acabo de saber de seu falecimento ocorrido na primeira semana de maio quando estive fora do Brasil e sem ler jornais.
Artur da Távola, jornalista e político, falava com propriedade e paixão sobre música clássica. Encerrava o seu programa sempre com as mesmas palavras, repetidas com carinho, ao final de cada edição: "Música é vida interior, e quem tem vida interior jamais padecerá de solidão".
Eram bons os seus textos.Postei algumas de suas crônicas neste blog. No dele, a última postagem foi esta que abaixo transcrevo. Segue-se um pedido de desculpas pelo afastamento. Já estava doente...
"Quinta-feira, Novembro 01, 2007
CURSO NOTURNO

Cansaço e caderno encardido
na luz errada, fio à mostra.
Dorida sala de aula.
Paredes cansadas de palavrão
Bancos melados ouvem
o professor ofegante
que idealiza salários
e um Brasil melhor
no guarda pó amargurado.
Lá fora, a rua é fragor
e antes das dez já deu vontade de trepar.

O pai ferroviário não desconfia
enquanto a mãe
passa a roupa da formatura
desde o primeiro ano.
O texto é difícil.
O tédio desaprende a atenção
e desprepara o saber.
As guerras púnicas são bocejo.

A fome fermentada em azia,
coadjuva o esforço de vir a ser.
Disputas perdidas de antemão
relegam a vida a planos secundários.
Resta o sonho do impossível
e a idealização do turno da manhã
com professores e louras alegres.
Tudo é Natal no turno da manhã.

Um sono e três assaltos
matemática entre fumaça
de ônibus humilhados
e geografia pelos trens da Central.
O desdentado grosseiro coça o saco.
Artistas abundam e desbundam
na capa dos cadernos.
Ninguém fala de Brahms
nem canta hinos a Manuel Bandeira.
O viado da turma já está ferido de morte.

Metade confia na vida e tudo é mérito.
A filha do pastor com medo da menstruação.
A caspa insulta alguns paletós.
Há gosto de sebo no pão dormido
e o espinhento toca bronha com dois dedos
disfarçando pelo bolso furado da calça.
O esforçado troca o direito ao jantar
por arroto de quibe ou pastel.
O rádio berra o rap
e a moça mastiga a goma da desesperança
num chiclete sem fim."

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